Crise no Paraguai gera tensão e esvazia comércio na
fronteira com Brasil
Lojistas em Ciudad del
Este dizem que rumores sobre fechamento da divisa afastam clientes; em Foz do
Iguaçu também há temor por sanções.
A crise
política que sucedeu a destituição do presidente paraguaio Fernando Lugo na
sexta-feira, provocando ameaças de sanções ao Paraguai por nações vizinhas, já
gera impactos na fronteira do país com o Brasil.
Em Ciudad del Este, polo comercial que atrai milhares de
compradores brasileiros diariamente, ao menos dez lojistas consultados pela BBC
Brasil calculam que houve queda de até 50% nas vendas neste fim de semana. Eles
atribuem o fraco movimento, entre outros motivos, aos rumores de que o Brasil
poderia fechar a fronteira com o Paraguai em resposta ao impeachment relâmpago
de Lugo.
O governo brasileiro, que considerou a destituição do presidente
um 'rito sumário' sem direito adequado de defesa, anunciou que sanções ao
Paraguai por eventual quebra de compromisso com a democracia (previstas em
acordos regionais) estão sendo avaliadas pelos membros do Mercosul e da Unasul.
Questionado neste domingo pela BBC Brasil se as medidas poderiam
incluir o fechamento de fronteiras, o Itamaraty afirmou que a ação está
prevista em protocolos multilaterais e que ela está sob discussão, mas que até
o momento não há definição sobre o assunto. Atualmente, o trânsito de pessoas
entre Brasil e Paraguai ocorre livremente pela ponte da Amizade, sobre o rio
Paraná.
Corredores vazios
Os rumores, no entanto, bastaram para que muitos brasileiros
adiassem os planos de fazer compras no país vizinho. No shopping Corazón, o
mais moderno de Ciudad del Este, a clientela era tão escassa que vendedores
saíam para os corredores para conversar com colegas de lojas vizinhas.
'Estamos todos muito preocupados', diz, sentada ao sofá, a
vendedora paraguaia Luz Ruiz. 'Para Ciudad del Este, fechar a fronteira seria a
morte'.
Segundo Ruiz, que trabalha numa loja de lingeries, no sábado
pós-impeachment os clientes só apareceram depois das 20h. No dia seguinte, diz
ela, o movimento continuava bem abaixo do normal. 'Como os domingos costumam
ser mais fracos, só saberemos do impacto real durante a semana'.
Ao seu lado, a vendedora brasileira Marta de Paula, que mora em
Foz do Iguaçu (PR), mas cruza a fronteira diariamente para trabalhar em Ciudad
del Este, teme perder o emprego caso a divisa seja fechada. 'Muitos brasileiros
que trabalham em Ciudad del Este e paraguaios que trabalham em Foz seriam
afetados', diz. 'O desemprego nas duas cidades explodiria'.
Além disso, ela afirma que, assim como os brasileiros se
abastecem de perfumes, brinquedos e eletrônicos no Paraguai, os paraguaios
compram do Brasil máquinas agrícolas e automóveis, gerando receita para o país.
As duas disseram crer, porém, que o Brasil não levará a cabo
qualquer ação que possa prejudicar brasileiros. 'Não faria sentido, eu acredito
no bom senso dos governantes', diz Ruiz.
Nem todos os vendedores, porém, consideram a crise política a
principal razão para o fraco movimento. Segundo Mercedes Capdevilla, vendedora
de uma loja de eletrônicos, nas últimas semanas o Brasil aumentou o controle na
fronteira, para fazer valer o limite de US$ 300 (R$ 600) em compras por pessoa.
Quem excede o valor deve pagar multa.
A atitude, diz ela, tem prejudicado o comércio. 'Quando voltar
ao procedimento antigo, as vendas vão subir de novo'.
'Presa no Paraguai'
Num dos raros grupos de turistas brasileiros que passeavam pelo
shopping, a fotógrafa Soraya Reichert diz que teve de convencer uma tia de que
não correriam riscos se cruzassem a fronteira.
'Ela estava com medo de ficar presa no Paraguai, sem conseguir
voltar para Foz', diz ela. 'Acho que se forem mesmo fechar a fronteira, vão
avisar com antecedência, para evitar o caos'.
Assim como os comerciantes, porém, ela espera que o governo
brasileiro não tome essa decisão. 'Foz do Iguaçu depende tanto daqui quanto
eles dependem de nós'.
Reichert diz que muitos brasileiros de Foz têm negócios na
cidade vizinha, como empresas de aluguel de veículos, lojas e construtoras. Ela
afirma ainda que o bloqueio da fronteira seria um terrível golpe para o turismo
que sustenta a cidade paranaense. Isso porque, segundo a fotógrafa, boa parte
dos viajantes de várias regiões do Brasil que se hospedam em Foz o fazem para
realizar compras no Paraguai.
'As duas regiões estão tão conectadas que qualquer ruptura seria
uma catástrofe, e para os dois lados.'
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