Vale: lucro
menor, mas apostas nas alturas
RIO - O tombo no lucro da Vale nos três primeiros meses do ano -
de 40% na comparação ao mesmo período de 2011, a R$ 6,7 bilhões - não abalou a
confiança do mercado nas ações da companhia. Corretoras, gestoras de recursos e
bancos de investimento avaliam que o pior ficou para trás, com o balanço
divulgado na semana passada, e que as perspectivas são mais positivas no
segundo trimestre. Nos últimos meses, a Vale passou por um inferno astral, como
a queda de preço dos minérios, problemas de logística, expectativa de um novo
marco regulatório do setor e a cobrança bilionária da Receita Federal.
Segundo Eduardo Roche,gerente de análise do Modal Asset, as ações
da Vale estão com preços "interessantes para compra". Desde janeiro
do ano passado, a queda chega a 14,6% nos papéis preferenciais (PNA, sem
direito a voto).
- Os problemas na Vale não estão completamente resolvidos, mas o
mercado decidiu retirá-los do caminho no curtos e médios prazos. O papel está
com preço interessante e os fundamentos da empresa vão prevalecer. O mercado
vai virar a chave - afirma Roche.
Essa avaliação é compartilhada por mais 16 analistas, que apostam
numa valorização média de 32,6% das ações nos próximos 12 meses. Mas, claro,
nada garante que isso vai efetivamente ocorrer.
Uma prova da confiança do mercado foi dada na quinta-feira
passada, no primeiro pregão da Bolsa após a divulgação do balanço da empresa.
As ações da Vale abriram em queda de 3,6% por causa dos resultados. Em poucas
horas, no entanto, estavam novamente em alta, após uma teleconferência de
analistas com a empresa. Resultados foram explicados e metas asseguradas, e os
papéis terminaram o dia em alta de 1,70%.
Geração de caixa e venda de minério decepcionam
Por dentro do balanço da Vale, um número que incomodou analistas
foi o de geração de caixa, o chamado Ebitda (lucro antes de juros, impostos,
amortizações e depreciações). Essa linha do balanço encolheu de R$ 12,8 bilhões
no quarto trimestre de 2011 para R$ 8,8 bilhões nos três primeiros meses deste
ano. O tombo era esperado, mas foi 20% maior do que o imaginado. Os embarques
de minério de ferro também desagradaram bastante: queda de 5,11% frente ao
mesmo período de 2011, para 54,8 milhões de toneladas.
Na teleconferência, a Vale culpou as fortes chuvas que
atrapalharam suas operações no começo do ano, mas acrescentou que os embarques
foram retomados. "Nós não perdemos a confiança de que vamos entregar os
números que prometemos", disse Murilo Ferreira, presidente da Vale,
durante o bate-papo com analistas.
O mercado "comprou" a explicação da Vale. Três bancos de
investimentos - J.P.Morgan, Deutsche Bank e BofA Merril Lynch - divulgaram na
semana passada relatórios positivos sobre a companhia e reforçaram suas
recomendações para a compra dos papéis.
O J.P. Morgan, por exemplo, se disse "encorajado" pelos
custos sob controle e pela confiança da empresa em cumprir a meta de embarque
do minério de ferro neste ano, que chega a 310 milhões de toneladas. "O
primeiro trimestre deve ter sido o piso de ganhos da Vale", afirma o
relatório assinado por Rodolfo De Angele, Mandeep Singh Manihani e Lucas
Ferreira.
O BofA Merrill Lynch lembrou que as exportações para a China -
principal cliente da Vale - foram retomadas em março. Mesmo assim, reduziu o
preço alvo das ações de US$ 31 para US$ 29. Essa previsão vale para as chamadas
ADRs (American Depositary Receipts), os recibos de ações negociados pela
mineradora na Bolsa de Nova York.
"Apesar da revisão, nós reiteramos a Vale como uma das
melhores ações para se investir na América Latina", afirma no relatório os
analistas Felipe Hirai, Thiago Lofiego e Karel Luketic. "Um catalisador
(para a alta das ações) de curto prazo pode ser liberação da licença de Serra
Sul, no Pará, e manutenção dos preços do minério de ferro".
Outro fator que poderia provocar a alta das ações seria a elevação
do preço do minério de ferro, hoje cotado a US$ 145 a tonelada no mercado à
vista da China. O preço segue abaixo da média de US$ 170 do ano passado e deve
apresentar bastante volatilidade neste ano, segundo especialistas.
Processo da Receita exige cautela do investidor
Hersz Ferman, gestor de renda variável da Yield Capital, afirma
que, apesar das recomendações dos grandes bancos e corretoras, muitos
investidores seguem cautelosos sobre a cobrança da Receita Federal sobre a
Vale, que podem chegar a R$ 30 bilhões:
- A Vale tem um desconto grande sobre seus pares internacionais,
na ordem de 15%, como BHP Billinton, Xstrata, Rio Tinto. Essa diferença já
reflete um valor próximo do passivo. O problema é que a Vale não provisionou os
valores para o caso de uma perda na Justiça.
No ano, as ações PNAs da Vale acumulam alta de 11,44% e as ONs
(ordinárias, com voto) sobem 9,78%. O Ibovespa, principal índice da Bolsa,
avançou menos, 8,80%, nesse período.