Agricultores contabilizam prejuízos provocados pela seca
na Argentina
Estiagem causou perdas em lavouras de
soja e milho do país.
Argentina está entre os maiores produtores de grãos do mundo.
A América do Sul está colhendo menos grãos nesta safra.
Esse é o resultado de uma seca que atingiu diversos países, inclusive o sul do
Brasil. A pior situação é a da Argentina, causando prejuízos em
lavouras de soja e milho.
A Argentina está entre os maiores produtores
de grãos do mundo. Na última safra, o país colheu mais de 48 milhões de
toneladas de soja e quase 23 milhões de toneladas de milho e esperava uma
produção ainda maior neste ano. Mas a falta de chuva atrapalhou os planos do
país vizinho.
A seca começou em meados de outubro, logo
após o plantio e na fase de desenvolvimento das lavouras, causando muitos
prejuízos para o milho e para a soja.
A seca atingiu a principal região produtora
de grãos do país, que compreende o norte da província de Buenos Aires, sul das
províncias de Santa Fé e Córdoba e parte da província de Entre Rios.
O agrônomo Fernando Musegne, pesquisador do
INTA, Instituto Nacional de Tecnologia Agropecuária da Argentina, explica que
mesmo com pouca chuva os agricultores conseguiram plantar o milho, mas o
desenvolvimento das lavouras ficou comprometido.
“Normalmente, o milho fixa o número de grãos
no período de floração. Foi justamente nesse período que mais faltou água. O
resultado são espigas menores que o normal”, diz Musegne.
A falta de água fez cair a produtividade das
lavouras. A média da região é de oito mil quilos por hectare. Esse ano, não
deve passar os quatro mil quilos. Quem plantou milho contabiliza os prejuízos.
A seca é mais um complicador para os
agricultores da região, onde a maioria trabalha com terras arrendadas. Uma área
com 700 hectares custa por ano US$ 350 mil só de arrendamento. Se juntar o
custo de implantação, manutenção e colheita da lavoura, o custo sobe para US$
750 mil por ano.
Quem toca a fazenda é Mário Pascoali. Ele é
dono de 250 hectares de terra, mas arrenda uma área com quase três mil
hectares. A lavoura de milho ficou concentrada nessa propriedade. Em anos
normais, o produtor colhe cerca de dez mil quilos de milho por hectare. Mas a
seca causou a perda de metade da produção.
Setenta por cento da produção argentina sai
de áreas arrendadas, pelas quais são pagos entre R$ 370 e R$ 900 por hectare
por ano só com aluguel da terra. Os agricultores custeiam as lavouras com
recursos próprios. Se a safra não rende o esperado, o plantio da próxima safra
fica comprometido.
A soja também foi afetada pela seca, mas com
prejuízos menores. Na Argentina, os produtores costumam fazer dois cultivos em
momentos diferentes: a chamada soja de primeira, plantada logo que termina o
inverno, no final de outubro, começo de novembro; e a soja de segunda, semeada
em dezembro, depois da colheita do trigo.
O produtor Martin Vivanco, dono de uma
propriedade de 80 hectares em San Antônio de Areco, plantou 400 hectares de
soja, a maior parte em terras arrendadas. Em anos normais, ele colhe perto de
3,6 mil quilos do grão por hectare. Este ano, por causa da seca ele espera
colher o máximo de 2,8 mil.
A Bolsa de Comércio de Rosário faz um
levantamento mensal da condição das lavouras e do clima, com o trabalho
coordenado pelo agrônomo Tomaz Parenti. “A área plantada com soja ficou em 19
milhões de hectares. A estimativa inicial de produção era de 50 milhões de
toneladas, mas deve ficar a redor de 44 milhões, com uma queda de mais de 10%.
De milho se espera uma safra de algo entre 18 e 19 milhões de toneladas”,
estima.
A área plantada com milho na Argentina
cresceu cerca de 10% nessa safra. Mesmo assim, a produção deve ser 10% do que
no ano passado. Na Argentina não existem linhas de crédito nem seguros
governamentais para a agricultura. Com a quebra na safra, como a renda dos
produtores cairá, a grande preocupação é encontrar formas para financiar o
plantio da próxima safra.
O produtor Daniel Berdini, dono de uma fazenda
de 250 hectares em Ramallo, plantou cerca de 600 hectares de soja em terras
arrendadas. Ele calcula ter perdido quase 30% da produção da soja de primeira.
O agricultor reclama que a situação fica mais
difícil por conta da política agrícola do país. Para se exportar grãos na
Argentina é preciso pagar um imposto alto, a chamada retenção, de 35% para a
soja, 20% para o trigo e 23% para o milho.
A política agrícola da Argentina preocupa
também os especialistas do mercado. O economista Raul Ochoa, professor de uma
das principais universidades do país, alerta que com tantos problemas, os
agricultores devem passar por dificuldades esse ano. “Como na Argentina 70% da
produção está na mão daqueles que não são donos da terra, é possível que muitos
desses arrendatários tenham dificuldades para a próxima safra. Muitos vão ficar
endividados, outros vão conseguir apenas pagar as contas e terão pouco dinheiro
pra investir”, explica.
“O impacto dessa seca na Argentina é muito
forte. A América do Sul, como um todo, iria colher esse ano 136 milhões de
toneladas, mas vai colher menos de 116 milhões, registrando uma perda de 20
milhões de toneladas. Isso afetou a geração, produção, consumo e estoques num
balanço global. Os preços já subiram. O maior problema na Argentina é o
problema político. A agricultura ao redor do mundo tem suporte estratégico de
governo. É uma questão de soberania nacional. A Argentina está perdendo
espaço”, explica o analista de mercado Antônio Sartori - analista de mercado.
Daniel Berdini diz que o maior problema é
que, hoje, o agricultor argentino vive num clima de incerteza.
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