Carne de cachorro: tradição e polêmica na Coreia do Sul
Seul,
12 mai (EFE).- De sabor intenso e aroma penetrante, a carne de cachorro é uma
iguaria para muitos sul-coreanos que, especialmente no verão, desfrutam pratos
elaborados com este animal apesar da rejeição de uma crescente minoria.
O consumo de carne de cachorro ou 'Kaegogi' na Coreia do Sul é
uma tradição de milhares de anos e se pratica de forma ocasional por ser um
prato relativamente caro (de R$ 25 a R$ 40 por pessoa) e só disponível em
restaurantes especializados.
'É delicioso e não se pode comparar com o porco ou o boi',
afirmou à Agência Efe Park Bit-garam, estudante de engenharia de 23 anos,
enquanto saboreia uma sopa de cachorro em um humilde restaurante do mercado de
Moran, ao sul de Seul, famoso pela criação de cães para consumo humano.
As lojas do mercado de Moran exibem jaulas com cachorros sem
raça específica ou 'Ddongke', cujo destino é ser sacrificados, depilados e
fervidos para se transformar em carne por peças a pedido do cliente -
particular ou restaurante.
Sem mal desviar o olhar do prato, Park relatou, entre distantes
latidos como som de fundo, que foi seu pai que, quando ele era pequeno, o levou
pela primeira vez para comer 'Boshintang', a mais popular 'sopa estimulante' de
carne de cachorro com diversos vegetais, sal e temperos.
Pai e filho desfrutam duas ou três vezes ao ano esta experiência
gastronômica na qual estreitam sua cumplicidade longe das mulheres da casa, mãe
e irmã, que fazem parte da imensa maioria da população feminina do país que
considera repugnante comer cachorro.
Este não é o caso da cozinheira do restaurante, Park Myeong-hwa,
de 62 anos, que assegura que 'comer carne de cachorro é bom para todo o corpo,
especialmente para a pele' e lembra que muitos médicos coreanos a recomendam
para seus pacientes quando estão fracos.
Na Coreia, o cachorro é considerado tradicionalmente uma grande
fonte de energia e também de virilidade masculina, algo que MoonHyun-Kyeong,
presidente da Associação Coreana de Nutrição, atribui à sua alta contribuição
de proteínas em uma dieta caracterizada, especialmente no passado, pela
escassez de carne.
A carne de cachorro, que apresenta valores de proteína similares
à de boi, porco e frango, segundo a doutora Moon, também 'contém uma elevada
quantidade de ácidos graxos insaturados' que ajudam a prevenir o colesterol e
doenças coronárias.
Apesar de ninguém questionar os valores nutricionais do
'Kaegogi', o debate ético ganhou força à medida que a Coreia do Sul se
transformou em um país desenvolvido, no qual milhões de pessoas convivem com
cachorros como animais de estimação.
'Os cachorros fazem parte da vida das pessoas, são inteligentes,
percebem o que acontece ao seu redor e expressam seus sentimentos', comentou
à Efe Seo Bora-mi, porta-voz da KARA, uma organização sul-coreana que realiza
intensas campanhas contra o consumo de carne de cachorro no país.
Seo denuncia uma obscura realidade na qual os cachorros 'vivem
aglomerados em jaulas pequenas sem condições mínimas de higiene' e, para
sacrificá-los, em alguns casos são usadas técnicas cruéis como golpes na cabeça
ou estrangulamentos.
Além disso, assegura que cachorros de todas as raças, 'de
poodles a maltêses', são comercializados como carne em diversos pontos do país.
Enquanto a KARA e outros grupos defendem a proibição total da
venda e consumo de 'Kaegogi', o pensamento generalizado na Coreia do Sul é que
o cachorro não merece um tratamento diferente ao de outros animais e que
aqueles que querem acabar com a tradição de consumi-lo se baseiam em critérios
subjetivos.
Por sua parte, as leis locais não ajudam a frear nem a
regularizar estas atividades, que acontecem à vista de todos, mas à beira da
clandestinidade.
Embora a legislação proíba tecnicamente a venda e o consumo de
carne de cachorro ao não considerá-la como gado, não estabelece penalizações a
respeito, o que obriga criadores a trabalhar em um vazio legal onde são
escassas as inspeções e os controles de saúde.
Nenhum comentário:
Postar um comentário