Organização propõe usar crédito de carbono
para ajudar produtores
Certificação a
agricultores e pagamento pela preservação estão em foco.
Recursos seriam aplicados para tornar produção sustentável.
O
Instituto de Pesquisa Ambiental da Amazônia (Ipam), organização que trabalha
pelo desenvolvimento sustentável do bioma, lançou nesta quarta-feira (28)
análise que aponta uma nova estratégia para manter a floresta em pé e reduzir
as mudanças climáticas.
A proposta do Ipam, citada na revista "Nature" desta
semana, quer unir dois mecanismos já existentes e que apresentam dificuldades
de emplacar. Um deles é o comércio de crédito de carbono, pelo qual emissores
de CO2 pagam para manter a floresta intacta. Para o instituto, a
comercialização não tem sido fácil porque faltam produtores interessados em
vender os créditos.
Outro mecanismo é a tentativa de alguns agricultores e
pecuaristas de tornar suas propriedades sustentáveis para atender padrões
internacionais de qualidade. Estes padrões conferem "selos" de
certificação, que podem aumentar o valor do produto. No entanto, diz o Ipam, as
recompensas não são compatíveis com os custos necessários para tornar o negócio
sustentável.
"[Compradores internacionais] impõem padrões, mas não dá
mecanismo para pagar [os gastos com as mudanças necessárias]. Estamos tentando
oferecer um mecanismo para pagar a conta", resume Daniel Nepstad,
coordenador de programas internacionais do Ipam.
Segundo o Ipam, as duas pontas são complementares e devem ser
unidas em um consórcio. Ou seja, créditos de carbono devem ser usados para
ajudar produtores rurais a tornar suas propriedades sustentáveis, recuperando
áreas desmatadas e aumentando a produtividade para produzir mais alimentos sem a
necessidade de novas terras e novos desmatamentos.
"A ideia é viabilizar transição da agricultura predadora
para agricultura sustentável. Essa transição não é sempre barata, precisa de
dinheiro, investimento, política pública, mas precisa também de demanda",
afirma.
Em junho no Rio de Janeiro, durante a Rio+20, a Conferência do
Desenvolvimento Sustentável da ONU, o Ipam pretende apresentar projetos pilotos
para a implementação deste consórcio em áreas da Amazônia.
Consórcio
global
Segundo o instituto, é possível e necessário viabilizar o consórcio em nível global. Isso seria possível porque os dois lados da moeda têm correspondentes em larga escala.
Do lado do comércio de carbono, está em gestação a criação de um
mecanismo que "compensa" financeiramente as nações que preservam a
floresta e contribuem para a redução dos gases causadores do efeito estufa.
Chamado de Redd+ (Redução de Emissões por Desmatamento e Degradação), ele foi
negociado na Conferência do Clima em Durban, em 2011 -- mas não obteve avanços
e por isso deve deve voltar a ser discutido.
Já do lado das melhorias nas propriedades rurais para obter
selos de qualidade, existem mesas de negociação internacionais para criar
padrões de sustentabilidade para algumas culturas. Até agora, já foram realizadas
três, segundo o Ipam: a Bonsucro, para a cana, a RTRS, para a soja, e a RSPO,
para o óleo de palma.
"Estamos tentando construir ponte entre dois processos
paralelos, que buscam várias coisas em comum, mas que até agora não foram
costurados. Eles andam no mesmo rumo, mas paralelamente. Um são as mesas
redondas das commodities e outro é o Redd", resume Nepstad.
Para mostrar como o consórcio poderia ser aplicado globalmente,
o Ipam mapeou países que já têm as duas iniciativas: projetos de Redd a nível
local e aplicação de padrões exigidos nas mesas redondas das commodities. Entre
as nações encontradas estão o Brasil, México e Indonésia.
Críticas
O representante do Ipam admite que a proposta pode ser vista como uma vantagem para compradores internacionais que querem comprar produtos mais sustentáveis sem pagar pelo seu custo.
Por outro lado, pode ser acusada de favorecer setores do
agronegócio, que vão obter recursos de créditos de carbono para realizar algo
que é uma obrigação legal: a preservação da floresta.
"Estamos em uma bifurcação super importante. A agricultura
brasileira pode se sentir impune, por exemplo, se ganhar a votação do código
florestal. Ou ela pode escolher um segundo caminho, imbutindo um compromisso
sócio ambiental. Assim, o Brasil garantiria liderança não só na agricultura,
mas também nas questões ambientais. Nós esperamos contribuir para a segunda
opção", conclui Nepstad.
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