sexta-feira, 17 de agosto de 2012

ENTREVISTA


Consumo no país não sentiu crise, e o pior já passou, diz economista-chefe do Credit Suisse



No fim de junho, o ministro Guido Mantega (Fazenda) chamou de "piada" a estimativa de crescimento do economista Nilson Texeira, do Credit Suisse. Ele projetava que a expansão da atividade neste ano ficaria em 1,5%.

Desde então, as projeções dos demais analistas do mercado convergem para o "cenário Credit Suisse", distante da estimativa oficial (3%).
Na semana passada, segundo pesquisa do Banco Central, o consenso do mercado chegou a 1,8%.
Apesar do número que causou desconforto no governo, Teixeira não se diz pessimista com o Brasil e suas projeções mostram um retrato de recuperação da economia.
Ele elogia o pacote do governo, anunciado anteontem, e afirma que o pior da contração da economia já passou.
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Há uma retomada em curso?

Nossas projeções assumem um crescimento bastante expressivo no segundo semestre. Isso dará uma expansão de 1,5% neste ano.
Mas o interessante é analisar os componentes do PIB. O consumo das famílias, ao contrário do que alguns imaginam, continua crescendo de maneira importante.

Quanto?

Bastante. Desde 2003, a expansão média do consumo é de 1,1% ao trimestre. No primeiro trimestre deste ano, ficou muito próximo disso (1%). Portanto, o consumo das famílias continua se comportando muito bem.
E a gente não vê nenhum processo de esgotamento desse lado. O que vemos, sim, vem dos investimentos. A desaceleração da atividade vem ocorrendo por causa da contração dos investimentos.

Haverá recuperação dos investimentos neste ano?

Olhando para a frente, a expectativa é de retomada.
Mas é difícil precisar em qual momento. Não nos parece que seja no início do terceiro trimestre, mas será em meados do terceiro trimestre? Ou no quarto trimestre?
Não dá para saber, porque depende também de fatores externos. Mas a gente continua argumentando que haverá recuperação.
E, dado o consumo das famílias, que já tem expansão forte, o PIB vai crescer mais no próximo ano do que neste e no ano passado.

Então é basicamente uma questão de confiança?

Nos parece que o setor corporativo brasileiro tem condições financeiras favoráveis e balanços fortes. É muito mais a perspectiva de curto prazo que faz com que investimentos sejam postergados. Assim que o cenário externo melhorar, haverá recuperação.

Como ter essa certeza?

Em parte porque o governo tem agido para tentar reduzir os custos desses investimentos. A taxa de juros vai diminuir, vai de 12,5% para 7,5%, podendo ir até a 7%.
Fora isso, há uma redução dos "spreads", bancários. E reduziram-se impostos. Alguns serão revertidos, outros não. O conjunto tende
a estimular os investimentos. Mas o governo não é capaz de fazê-los acelerar imediatamente.

Como avalia o pacote de concessões lançado anteontem?

O anúncio sobre ferrovias e rodovias é bastante favorável. Mostra atitude do governo de buscar reduzir os custos domésticos de produção de uma maneira estrutural.
É favorável saber também que, nas próximas semanas, haverá anúncio para portos e aeroportos. Além disso, há a leitura de que está por vir uma redução da carga tributária, que nesse primeiro momento parece ser da energia.

Qual seria o impacto da desoneração da energia?

Suponhamos que o corte seja de 20%. O impacto na inflação será de 0,7 ponto percentual. Mas, para as empresas, a redução do custo de produção é bem expressiva. Então, o impacto pode ser uma redução da inflação em até 1 ponto percentual.

As medidas de anteontem podem ter efeito imediato?

Em 2012 podem provocar um sentimento mais favorável na sociedade, mas não a ponto de alterar nossas projeções. Nem no próximo ano.
Mas as medidas valem muito mais do que os R$ 133 bilhões. Valem pelo governo mostrar que está no caminho de privilegiar o setor privado.

A presidente Dilma verá o resultado dessas concessões ainda no seu governo ou é algo para o longo prazo?

Verá. É difícil saber em quanto tempo, pois não depende só do governo. Mas essas medidas estimulam os investimentos e abrem espaço para investimentos maiores.
No ano que vem, na nossa estimativa, o PIB crescerá 4%, e o investimento, 8%. Ou seja, é uma boa recuperação.

Os juros vão permanecer baixos por um período longo?

A curva de juros futuros diz que vão parar em 7,25%. A atividade cresce menos do que a expectativa, e há menores riscos inflacionários.
Assumindo que não haja uma aceleração muito mais expressiva nos preços de commodities, que eles não se transmitam para carnes e açúcar, a inflação ficará bem comportada, 5,1% ou 5,2%.
Nessas circunstâncias, é possível que a redução dos juros seja prolongada. Se a atividade demorar mais tempo para se recuperar, não se pode descartar uma nova redução dos juros em novembro, chegando abaixo de 7,25%.

É um risco para a inflação?

Não é a nossa leitura neste momento. Há risco de a inflação ser maior do que a nossa projeção por conta dos fatores que mencionei, mas em 2013 ela pode ficar igual ou um pouquinho abaixo. Ou seja, uma inflação acima da meta [de 4,5%], mas estável e próxima à meta.

O sr. foi um dos primeiros a projetar crescimento de 1,5% neste ano. Na época, o ministro Guido Mantega chamou de "piada" a estimativa. O sr. se acha um pessimista?

Não, eu sou otimista. Estou no mercado há muito tempo. No começo, eu era um analista pessimista com o Brasil. Mas, nos últimos dez anos, eu me tornei mais otimista.
E, de fato, nossas projeções são otimistas. A diferença entre a nossa projeção e as mais altas no mercado me parece ser uma recuperação mais acelerada dos investimentos, o que não é impossível, mas improvável neste momento.

O pior já passou?

A menos que haja uma nova onda de crise externa, nos parece que o pior já passou.

Quando foi o pior momento?

Uma avaliação qualitativa com nossos clientes mostra que o pior momento foi no segundo trimestre deste ano. Daqui para a frente, há uma perspectiva mais favorável.
Os salários continuam crescendo. A taxa de desemprego está baixa. Daí a popularidade alta da presidente, muito associada a fatores econômicos.








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