Existe o risco de uma
'Brasilapatia'?
Com crescimento
global desacelerando e vulnerabilidades domésticas, especialistas alertam para
risco de economia brasileira perder 'brilho' aos olhos dos investidores
estrangeiros.
Em um cenário de renovada desaceleração econômica global,
o Brasil pode vir a enfrentar uma temível 'apatia' dos investidores
estrangeiros, acredita um economista brasileiro da Universidade de Columbia, em
Nova York.
Até agora, o país surfou em uma onda positiva
de boom de commmodities, dinamismo econômico, expansão do mercado doméstico,
aposta do setor privado neste mercado e status de destino privilegiado de
investidores internacionais.
Entretanto, o modelo centrado no aumento do
consumo doméstico e na expansão do crédito dão mostras de arrefecimento.
Especialistas ouvidos pela BBC Brasil alertam
que é preciso resolver o impasse das reformas para estender o bom momento
econômico no futuro.
No campo externo, um dos motores do
crescimento brasileiro - a expansão rápida da economia chinesa - esfriou no
segundo semestre deste ano, desacelerando para o seu menor nível desde 2009.
Paralelamente, as revisões para baixo da
capacidade de crescimento do Brasil podem corroer a capacidade do país de
atrair investimentos, crê Marcos Troyjo, professor-adjunto de Escola de
Assuntos Públicos e Internacionais de Columbia, em Nova York.
Para Troyjo, este seria o efeito mais
importante da desaceleração global, já que o Brasil tem uma taxa de poupança
relativamente baixa e precisa dos investimentos externos para complementá-la.
'Antes havia uma Brasilfobia - achava-se que
o Brasil não era um porto seguro para os investimentos. Depois houve uma
Brasilmania. Agora estamos vendo uma Brasilapatia', argumentou o pesquisador.
'Está todo mundo esperando para ver se o país
avança nas reformas para aumentar a sua competitivdade: diminuir e simplificar
impostos, reduzir o Estado, investir em ciência e tecnologia e modificar suas
leis trabalhistas.'
Dependência chinesa
O esfriamento da economia chinesa no segundo
timestre deste ano, quando registrou crescimento de 7,6% - sua pior taxa em
três anos -, acendeu o sinal amarelo para os efeitos disto no mundo e no Brasil
em particular.
A China responde por 18% das exportações
brasileiras. Uma desaceleração no país asiático, portanto, tem impacto sobre as
trocas do Brasil com o exterior.
Todo o comércio exterior equivalia a apenas
cerca de 20% do PIB brasileiro no fim do ano passado, com a participação das
exportações para a China representando menos de 2% da riqueza nacional.
Mas para o vice-presidente executivo da
Associação de Comércio Exterior do Brasil (AEB), Fábio Martins Faria, a maior
preocupação da desaceleração chinesa não é o impacto direto sobre as trocas
bilaterais. É o efeito da redução da demanda sobre os preços das commodities
vendidas pelo Brasil para o mundo.
As exportações nacionais para a China são
concentradas em cinco produtos - soja, minério de ferro, petróleo, celulose e
açúcar - sendo que os três primeiros respondem por 85% do total.
'Setorialmente, o efeito que a China tem
sobre a economia do Brasil é maior do que a participação no PIB revela', diz
Faria. Ele dá como exemplo os contratos para fornecimento de minério de ferro,
que têm sido fechados a preços menores desde o ano passado.
Troyjo argumenta que o Brasil apostou tanto
no seu comércio com a China, centrado em matérias-primas, que 'dormiu no ponto'
na questão fundamental de elevar a participação das manufaturas na sua pauta de
exportações.
Tanto Troyjo quanto Faria concordam que seria
benéfico para o Brasil fazer um esforço na relação com os EUA - para quem o
país vende produtos de maior valor agregado e na qual nenhum produto tem
dominância completa sobre a pauta.
A participação dos EUA nas exportações
brasileiras tem caído para cerca de 10% do total comercializado com o exterior
em 2011. No ano passado, as vendas brasileiras para o país chegaram a quase US$
26 bilhões, ainda um pouco abaixo do nível de 2008.
Neste ano, até junho, o desempenho estava
caminhando para se repetir. Mas Faria nota que parte do impulso por trás das
vendas brasileiras para os EUA se deve às exportações de petróleo.
Além do quê, é possível que uma desaceleração
tanto ao norte quanto ao sul do Equador tenha um efeito negativo sobre essas
trocas.
Investimento
Possivelmente, uma desaceleração global
também pode afetar os investimentos no Brasil, por causa da percepção reduzida
de ganhos por parte dos investidores.
Após chegarem a prever uma expansão de 4,5%
para a economia neste ano, as estimativas do mercado já se situam abaixo de 2%.
Apenas o governo e organismos multilaterais como o Fundo Monetário
Internacional (FMI) são mais conservadores no rebaixamento de suas projeções.
Ao mesmo tempo, os céticos ainda aguardam os
resultados das medidas de estímulo tomadas pelo governo brasileiro, de isenção
de impostos combinada com compras governamentais. Medidas que os críticos têm
qualificado de 'paliativas'.
É consenso que, sem o mesmo dinamismo
econômico das principais economias emergentes, é mais difícil para o Brasil
abocanhar uma parte mais significativa dos investimentos destinados a esses
países.
A Sociedade Brasileira de Estudos de Empresas
Transnacionais e Globalização Econômica (Sobeet) estima que o Brasil receberá
investimentos estrangeiros da ordem de US$ 50 bilhões neste ano, uma queda de
25% em relação ao ano passado.
'Exportar ou morrer'
No mesmo período, o fluxo global de
Investimento Direto Estrangeiro (IDE) no mundo deve chegar US$ 1,6 trilhão - ou
aumento de 5% no mesmo período do ano anterior, nas estimativas da agência da
ONU para o Comércio e Desenvolvimento (Unctad).
Ao divulgar uma pesquisa da Unctad no início
deste mês, o presidente da Sobeet, Luís Afonso Lima, disse que 'no longo prazo,
o Brasil começa a perder um pouco o brilho' de que hoje goza aos olhos dos
investidores.
Os especialistas creem que o país só
recuperará este brilho se fizer reformas que desonerem as suas exportações e
aumentem a sua competitividade no mercado externo.
'O Brasil está na mesma situação que estava
depois da crise asiática (de 1997), quando o ex-presidente Fernando Henrique
Cardoso disse que a alternativa para o país era 'exportar ou morrer'', sustenta
Troyjo.
'O melhor estímulo para a economia brasileira
não é tentar aumentar o consumo através de renúncia fiscal deste ou daquele
produto, mas dar um sinal de que está comprometido com reformas sérias para
elevar a sua competitividade.'
Na mesma linha, Faria acredita que o país
precisa aproveitar um momento econômico que ainda lhe é favorável para fazer as
reformas e se tornar mais atrativo aos olhos externos.
'Há uma incapacidade das forças políticas do
Brasil de pensar no mais longo prazo', reclama o porta-voz dos exportadores. 'O
problema é que esse momento favorável uma hora pode deixar de sê-lo.'
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